A responsabilidade pelo transporte coletivo é compartilhada entre poder público e iniciativa privada. As prefeituras ou governo estadual, no caso do transporte metropolitano, definem os parâmetros de execução nas licitações de transporte, enquanto os empresários entram como operadores, seguindo os critérios e o planejamento estabelecido. O sucesso desse modelo beneficia diretamente o passageiro, com melhorias no preço, na velocidade e no conforto.
Em tese, a concorrência estabelece diversos padrões, como volume de veículos necessários, número de passageiros transportados, valor cobrado pela tarifa, itinerários, entre outros pontos em índices passíveis de mensuração. “A licitação deve ser adequada, prever índices corretos, para garantir um processo licitatório robusto, com fiscalização dos contratos e das empresas”, explica o empresário de transportes Bruno Piccoli.
Por se tratar de contratos de longo prazo, em geral superiores a uma década, os investimentos das empresas são grandes, e os índices estipulados pela concorrência serão usados para fiscalizar a operação do transporte. As companhias vencedoras devem cumprir todas as diretrizes do contrato, incluindo pessoal, treinamentos, veículos e outros equipamentos. Ao atrair empresas responsáveis, o estado garante a qualidade do transporte e diminui os riscos.
Ao contrário do que se imagina, as licitações de transporte são vistas com bons olhos pelas empresas operadoras. “O empresário vai ter segurança jurídica de que vai poder realizar o investimento necessário. O transporte é uma atividade de capital intensiva, com aportes grandes e de prazo, que terão que ser honrados”, explica Piccoli. Para o passageiro, a boa relação entre poder público e empresário resulta em um sistema mais rápido, com menor custo e mais confortável.
Uma das possibilidades nos novos contratos é a alteração dos modelos de remuneração: saindo de passageiro transportado para o quilômetro rodado, baseado em uma sugestão do Instituto de Defesa do Consumidor.
Na avaliação de Piccoli, o modelo de licitação é eficiente, e o grande desafio está em inovar sem gerar novos problemas. De acordo com ele, a planilha da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) traz boas referências e deve ser usada, incluindo um aumento do subsídio pelo poder público. “É preciso entender que o passageiro não pode ser o único a bancar os custos. Há países do mundo com quase 70% do custo total bancado pelos subsídios públicos”, afirma.
Recentemente, em um artigo publicado no site da ANTP, o presidente da Associação Nacional dos Transportes Urbanos (NTU), Francisco Christovam, sugeriu uma alteração nas licitações brasileiras, que, normalmente, contemplam tanto a operação quanto a aquisição da frota pelas empresas de transporte.
Ele cita o exemplo de Londres, de Santiago e de Bogotá, que, na concorrência, determinaram a formação de Sociedades de Propósito Específico (SPE) para a aquisição dos veículos.
“O modelo londrino, por exemplo, considerou a aquisição da frota – para o ônibus double-decker – pelo poder público e a operação dos serviços pelo setor privado. Dessa forma, todo o investimento no material rodante é de responsabilidade do poder concedente, cabendo às empresas privadas apenas a operação das linhas e a manutenção dos veículos”, cita.
Um dos grandes desafios das licitações é diminuir as interpretações subjetivas, aumentando a transparência. “O sistema não pode ficar à mercê de interpretações diversas, o que diminui a segurança para investimento, aumentando a chance de empresas aventureiras”, diz Piccoli. “Regras claras permitem o planejamento por todos, o que abre espaço para melhoria do serviço e inovação. Sem isso, o desafio é como será para sobreviver ao próximo mês”, ilustra.
O empresário cita que, em um contrato de operação de suas empresas, já lidou com a mudança de remuneração por três vezes. “Tive que fazer um investimento de R$ 8 milhões em frota. Eu assumi o compromisso com instituições financeiras, como vou honrá-lo? Qual a segurança para adquirir os novos ônibus previstos em contrato?”, questiona.
Para Christovam, as licitações podem e devem ser modernizadas. Dessa forma, elas serão capazes de “atender às novas exigências dos clientes do transporte coletivo urbano de passageiros, para permitir maior flexibilidade gerencial e garantir o cumprimento das políticas públicas definidas pelo poder concedente, bem como para conferir maior segurança jurídica às empresas operadoras”, escreveu.
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