Quase sete a cada dez brasileiros afirmam que trocariam seus carros ou motos por alternativas de transporte mais sustentáveis. Ao menos, é o que indica uma pesquisa realizada pelo Instituto Clima e Sociedade. O pensamento inicial quando se fala em uma alternativa menos poluente é o ônibus elétrico, mas isso não é, necessariamente, uma verdade, na avaliação do CEO da Metrocard, Ayrton Amaral Filho.
“O transporte coletivo é bem superior ao individual no quesito sustentabilidade sustentabilidade ambiental e econômica”, diz. “A primeira coisa que devemos fazer é aumentar o impacto do transporte coletivo e torná-lo mais atrativo para as pessoas que estão no transporte privado”, ressalta. Para permitir às pessoas fazerem essa transição, é preciso garantir três fatores nos ônibus: velocidade, oferta e segurança.
“As pessoas querem estar em casa ao mesmo tempo que chegariam com um veículo privado. Para isso, é preciso investir na infraestrutura, priorizando o coletivo sobre o individual. Ninguém gosta de andar no ônibus ou metrô lotado: ou seja, é preciso ter mais veículos. Deve-se também garantir a segurança dos passageiros”, afirma Amaral Filho.
Em meio à pandemia, diversas cidades reduziram drasticamente o deslocamento de veículos individuais, mas mantiveram o transporte coletivo. Essa medida se reverteu em menos poluição, menos ruídos e mais qualidade de vida. Cidades sem transporte coletivo se tornariam um verdadeiro caos, sendo inclusive um meio seguro de circular durante a pandemia, como indicara evidências recentes.
Na avaliação do CEO da Metrocard, a discussão sobre a sustentabilidade ambiental em um meio como o de transporte público precisa ser ponderada. Não se trata apenas de fazer uma migração imediata para os veículos elétricos, mas de entender a estrutura do país e o impacto dessa transição para um sistema, que, atualmente, é bancado em sua maioria apenas pelos passageiros.
“Enquanto a matriz energética global não atinge 30% de fontes renováveis, o Brasil conta com mais de 80% desse total. Essa pressão sobre veículos elétricos tem que ocorrer nos países com uma matriz diferente da nossa”, diz Amaral Filho, argumentando que o impacto ambiental do país é menor do que de outras nações pelo uso de fontes hidrelétricas, solares e eólicas para a geração de energia.
Dessa forma, é possível pensar em um planejamento mais adequado para a migração. “Não é possível que a sustentabilidade ambiental se sobreponha à econômica, mas somos favoráveis para que essa mudança aconteça, de forma gradual”, ressalta. Além disso, a própria tecnologia usada no transporte coletivo se tornou menos agressiva ao meio ambiente.
A partir de 2023, o Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve) exige a presença do Euro6, o que faz com que os motores emitam 60 vezes menos particulados, diminuindo a poluição na atmosfera. Nesse sentido, o incentivo ao transporte coletivo e a redução do uso de veículos individuais traria resultados tão impactantes quanto a troca de alguns veículos à combustão por elétricos.
“É impossível comparar um ônibus que rodava antigamente com um atual, pois há uma diferença gritante nas emissões entre eles devido à tecnologia e às exigências atuais. Os novos motores contam com tecnologia para a recirculação de gases e sistemas catalisadores e operam com um combustível com menor quantidade de enxofre, como o S10”, explica Amaral Filho.
Além das questões macro, é importante considerar os aspectos específicos de um contrato de transporte. Atualmente, um ônibus elétrico custa seis vezes mais do que um veículo tradicional. “Obrigar os empresários a adquirir esses veículos inviabilizaria a operação, pois o custo aumentaria demais, especialmente se o valor for repassado ao usuário, o que vai impactar a tarifa e reduzir o volume de passageiros”, argumenta.
Por esse motivo, a troca precisa ser muito bem estruturada do ponto de vista econômico e também da autonomia da operação. Um ônibus metropolitano roda entre 300 e 350 quilômetros por dia, e a capacidade dos elétricos costuma ser de 250 quilômetros. Vale destacar que há itinerários na Região Metropolitana com mais de 70 quilômetros. “É possível que ele fique parado para recarregar? Isso precisa ser analisado”, diz.
Nesse contexto, Amaral Filho lembra que, no início do século passado, a frota de ônibus de Nova Iorque era totalmente elétrica e foi abandonada pelo uso do petróleo. Por quê? “Era mais barato e mais fácil de distribuir. Agora o tema volta à tona pelos aspectos ambientais”, diz.
De acordo com a pesquisa do ICS, 19% dos brasileiros têm a bicicleta como principal meio de transporte. Para o CEO da Metrocard, é preciso que as bikes sejam integradas aos sistemas de transporte coletivo de forma inteligente. “Qualquer modal de transporte é positivo, desde que ele tenha determinados atributos. A bicicleta como conceito é muito interessante pra última milha, pois dá a autonomia de sair a hora que quiser, exatamente como o veículo privado”, opina.
Mesmo nos sistemas de transporte mais vascularizados, é difícil levar o paciente a todos os locais: ou seja, dos terminais até a sua casa ou trabalho. “É equivocado pensar a bicicleta como um transporte de massa, mas é importante que ela seja integrada ao sistema”, diz, citando a possibilidade de espaços seguros para estacionar esses veículos em terminais.