As formas de financiamento e custeio do transporte coletivo no Brasil precisam ser rediscutidas – é o que defende a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) em seu guia lançado no ano passado. Atualmente, no país, os sistemas de transporte coletivo são sustentados basicamente pela tarifa dos usuários – e, conforme a ANTP, um a cada cinco passageiros viaja gratuitamente, devido às políticas sociais de gratuidades no transporte público.
Uma das maneiras de mudar este cenário, na avaliação do consultor em transporte e mobilidade André Fialho, é incluir fontes externas de financiamento. Essa é a realidade de diversos sistemas de transporte fora do Brasil, especialmente na Europa e em outros países desenvolvidos, como o Canadá.
Um estudo publicado pela European Metropolitan Transport Authorities (EMTA) mostra que, na Europa, o poder público subsidia, em média, 50% do custo do transporte público, caso de cidades como Barcelona, Berlim e Frankfurt. Em outros municípios, esse aporte ultrapassa a metade dos custos, caso de Madrid, Mallorca, Copenhagen, Varsóvia e Praga – que lidera este ranking, com quase 80% de subsídios.
Embora seja adotado em escala global, o subsídio ainda é aplicado em casos raros no Brasil. O motivo, segundo Fialho, envolve a escassez de recursos pelas prefeituras ou a falta de prioridade política. “Nem todos os municípios têm recursos suficientes para incluir um subsídio que seja representativo. Em outros, porém, falta prioridade política e deixa-se o ônibus rodar em meio ao trânsito”, afirma Fialho.
A falta de investimento da sociedade no sistema de transporte faz com que o valor da tarifa seja alto no Brasil. Em média, as passagens no país custam próximo de R$ 5, enquanto na América Latina o preço médio é metade desse valor. “Esse preço é alto para um país como o Brasil, pois é o passageiro quem paga tudo, inclusive as gratuidades”, reforça o consultor. “A rigidez do transporte custa muito: há muitos ônibus, muito capital investido, muita operação e muitos horários. O subsídio auxilia a equilibrar esses custos”, acrescenta.
A discussão sobre o financiamento se tornou ainda mais importante após a eclosão da pandemia, quando se viu uma forte redução no volume de passageiros transportados.
Desde 2015, a mobilidade é considerada um Direito Social pela Constituição. Apesar disso, ao contrário de outros segmentos, o transporte coletivo – em sua grande maioria no Brasil – não conta com recursos do poder público, como acontece com o Sistema Único de Saúde (SUS), por exemplo.
Segundo Fialho, os técnicos em transporte discutem este tema há muitos anos e já há algumas sugestões para custear o subsídio. “Poderia se obter recursos a partir de outros setores que se beneficiam da infraestrutura da cidade, como os automóveis. Hoje, eles não pagam nada para financiar o transporte público”, explica. Para Fialho, os próprios condutores seriam beneficiados, já que, sem o transporte público, as cidades teriam “uma qualidade de vida péssima, com congestionamentos permanentes”.
Além de taxar os automóveis (veículos individuais), uma possibilidade mencionada seria destinar uma parte da contribuição sobre os combustíveis, a Cide, para o transporte coletivo.
Outras sugestões são o pedágio urbano (cobrando dos veículos o acesso ao centro das cidades) e a criação de taxa que destine recursos de aplicativos de mobilidade ao transporte coletivo.